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Diabulimia: conheça o transtorno alimentar que atinge pessoas com diabetes

12 de março de 2021 | escrito por

Imagine ter diabetes do tipo 1 e reduzir ou deixar de tomar insulina de forma proposital para conseguir emagrecer? É o que acontece com pessoas que sofrem de diabulimia, um transtorno que combina a doença com a bulimia.

Nesses casos, ocorrem práticas purgativas como vômitos, uso de laxantes e diuréticos, mas a diabulimia também pode estar associada a outros transtornos alimentares como a anorexia nervosa, quando a pessoa passa a restringir a sua alimentação. Ambas as combinações são bastantes perigosas, já que as pessoas com diabetes tipo 1 necessitam de insulina diariamente para manter os níveis de açúcar no sangue adequados e evitar as complicações graves da doença crônica.

Vale destacar que a insulina metaboliza o alimento e o converte em energia em nível celular. Se o organismo não tiver insulina, ele não utilizará a energia dos alimentos e assim ocorre uma grande perda de peso, já que o açúcar extra (e calorias) acaba sendo eliminado pela urina. É por isso que quem tem a diabulimia deixa de tomar o hormônio ou o diminui drasticamente: para não engordar, mesmo comendo compulsivamente.

Causas do transtorno

Os especialistas acreditam que as causas para a diabulimia estão ligadas a uma insatisfação com o peso e a imagem corporal. E também devido à necessidade de focar a todo instante na alimentação, monitorização da glicemia e a necessidade de aplicar várias doses de insulina por dia, de acordo com os carboidratos ingeridos.

“Essas situações são fatores que causam um estresse psicológico que, somado a um quadro de baixa autoestima, acarreta em uma necessidade de retomar o controle da própria vida”, explica Claudia Pieper, endocrinologista e co-coordenadora do Departamento de Doenças Psicossociais e Transtornos Alimentares da SBD (Sociedade Brasileira de Diabetes).

“Diabetes é uma doença que precisa de atenção e tratamento para a vida inteira. É comum também que surjam comportamentos como compulsão alimentar e, em seguida, a diabulimia. É algo muito sério, pois a combinação de diabetes com transtornos alimentares aumenta o risco da mortalidade devido às complicações da doença”, diz Nicole Brek, nutricionista especialista em transtornos alimentares e colaboradora do Ambulim (Programa de Transtornos Alimentares do Instituto de Psiquiatria do Hospital das Clínicas).

Esse comportamento perigoso é mais comum do que se imagina. De acordo com dados da American Diabetes Association, cerca de um terço das mulheres com diabetes tipo 1 relataram fazer restrições de insulina.

Sintomas e diagnóstico de diabulimia

Os sintomas costumam ser difíceis de identificar, por isso é fundamental que a pessoa com diabetes receba acompanhamento de uma equipe de profissionais de saúde de diversas áreas, como endocrinologistas, nutricionistas e psicólogos, que fique atenta aos sintomas e mudanças de comportamentos.

Entre os sinais que merecem atenção, podemos citar:

  • Perda de peso sem justificativa;
  • Hemoglobina glicada (glicemia) acima de 9% com frequência;
  • Sede persistente e excesso de urina;
  • Preocupação excessiva com o peso e imagem corporal;
  • Depressão, alteração de humor ou fadiga;
  • Omissão de glicemias, aplicações de insulina e hábitos de alimentação para os familiares e amigos;
  • Mudanças no padrão alimentar;
  • Retardo no desenvolvimento e no aparecimento dos sinais da puberdade;
  • Uso excessivo da balança;
  • Compulsão alimentar;
  • Atividades físicas em excesso.

Quais são os riscos?

Parar de aplicar insulina traz diversos riscos para a saúde da pessoa com diabetes e, em casos mais graves, leva à morte. Uma complicação bastante comum é a cetoacidose diabética, ou seja, uma descompensação da glicemia que ocorre quando o açúcar no sangue está muito alto e as substâncias ácidas, chamadas cetonas, atingem níveis perigosos no organismo.

Entre os sintomas estão confusão mental, hálito alterado, fadiga e respiração acelerada. Nesses casos, torna-se uma emergência médica. Foi o que aconteceu com a estudante de psicologia Fernanda*, 20. A jovem conta que por causa da diabulimia teve cetoacidose diabética e chegou a ser internada na UTI.

“Tive fases que diminui mais da metade da dose de insulina. Tomava apenas o necessário para não ter de ir para o hospital. E assim emagrecia muito rapidamente. Após voltar a tomar insulina, eu ficava inchada e com medo de engordar e abandonava o tratamento. Se tornou um ciclo”, diz.

Ela também restringia a quantidade de carboidratos da dieta e teve vários episódios de compulsão alimentar. “Não tive complicações graves, mas sofri muito para conseguir me curar. Ninguém conhecia o assunto quando fui buscar ajuda. Até hoje sinto vontade de parar de aplicar a insulina para emagrecer, mas coloco a minha saúde em primeiro lugar”, completa.

A diminuição da dose de insulina leva ao aumento da glicemia e proporciona alterações irreversíveis ao organismo de quem tem diabetes. Eles podem ter quadros de hipoglicemias graves e complicações crônicas como retinopatia (danos na retina que causam cegueira), nefropatia (lesão no rim) e neuropatia diabética (distúrbios nos nervos nas pernas e pés) de início precoce.

A importância do tratamento

A perda de peso muito rápida causa uma sensação de controle do corpo e o fato de o diagnóstico do diabetes tipo 1, geralmente, ocorrer no início da puberdade aumenta o risco da diabulimia em pessoas muito jovens. Por isso, o tratamento costuma ser demorado e envolve diversas abordagens para alterar os padrões de comportamento e diminuir os gatilhos.

“Infelizmente, as consequências da diabulimia não podem ser recuperadas. Pesquisas mostram que a mortalidade das pessoas com esse transtorno aumenta consideravelmente. Assim, o apoio psicológico é indispensável tanto para o indivíduo quanto aos seus familiares”, diz Ana Maria Roma, nutricionista e coordenadora da área de Nutrição do Proata (Programa de Atendimento a pacientes com Transtornos Alimentares) da Unifesp (Universidade Federal de São Paulo).

Segundo ela, é preciso abordar as consequências da restrição da insulina e os riscos para a saúde desde cedo. Além disso, é fundamental que os profissionais de saúde tenham informações e conheçam mais a diabulimia, para conseguir diagnosticar de forma precoce, e a família compareça às consultas e participe do tratamento.

“Os médicos, nutricionistas, endocrinologistas e psicólogos que lidam com as pessoas com diabetes precisam ter um olhar diferenciado para com esses indivíduos. A família deve apoiar e evitar julgamentos ou buscar um culpado para que o tratamento seja eficaz”, diz Roma.

*O nome do personagem foi alterado para preservar sua identidade

Fonte: Uol

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